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MATO GROSSO - 16ª SUBSEÇÃO DE JUÍNA

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O retrocesso da quantificação dos danos morais nos dias atuais: A quem interessa?

Data: 11/03/2019 14:34

Autor: Gustavo Tostes Cardoso*

    Vira e mexe a sociedade jurídica se depara com alguns temas tormentosos, difíceis de serem enfrentados, seja pela complexidade do tema, seja pela delicadeza dos envolvidos e os efeitos dos entendimentos aplicados pelos magistrados de nosso País, sobretudo como isso refletiria na sociedade.

    Uma sociedade que hoje se diz mais atuante ou, pelo menos, mais reivindicadora de seus direitos.

    O chamado Dano Moral, também conhecido como dor da alma, começou a ser aplicado com mais frequência no Brasil quando da interpretação do artigo 5o da Constituição Federal que expressamente dispõe: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

    Outros códigos, súmulas e enunciados também definem e garantem a reparação pelo dano simplesmente moral, e não acreditamos ser necessário ficar explicando o que está mais que sedimentado na sociedade: a honra do cidadão tem valor.

    O Dano Moral, que em nosso modesto sentir foi uma das maiores conquistas da sociedade brasileira, notadamente a chamada sociedade consumerista, nos dias de hoje vem sendo aplicado de maneira muito homeopática pelos juízes, principalmente no nosso Estado de Mato Grosso.

    Em um passado não muito distante, lá pelos idos de 2002 para 2003, as indenizações eram severas até demais. Indenizações por uma devolução de cheque de maneira indevida eram arbitradas em valores muito superiores a R$ 100.000,00 (cem mil reais), e nossos Tribunais souberam, a tempo e modo, combater esses excessos.

    Com o passar dos anos, os advogados, diante da minoração dos valores arbitrados na chamada Justiça Comum, apontaram suas ações para os chamados Juizados Especiais Cíveis, local em que o feito deveria, pelo menos em tese, ser mais célere, barato e justo. Ledo engano e explicaremos mais adiante os motivos.

    Quando as ações começaram a ser distribuídas nos Juizados Especiais, tivemos a oportunidade de perceber que os Magistrados vinham aplicando as indenizações por dano moral com seu caráter dúplice (punitivo/pedagógico) de maneira correta e prudente.

    Nesse tempo as indenizações ficavam entre os valores de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a pouco mais de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) em alguns casos excepcionais.

    Quem quisesse pleitear valores maiores teria que socorrer-se da Justiça Comum e aguardar o julgamento da ação e de vários recursos. Essa demora de resposta estatal já era um novo desestímulo. Quase todas as ações de cunho moral foram parar nos Juizados Especiais.

    Necessário se faz abrir uma diferenciação entre a aplicação das condenações de dano moral entre empresas de grande porte, tais como telefonia, bancos, planos de saúde, fornecedoras de energia dos valores a serem aplicados contra, p. ex. um comerciante local.

    Ao condenar prestadoras de serviços de telefonia em R$ 15.000,00 (quinze mil reais) o magistrado (avaliando o caso concreto) tem a certeza de que o valor, apesar de não ser tão alto, certamente traz consigo um alento ao ofendido e não causa grande perda patrimonial a essas gigantescas empresas.

    De outra banda, o mesmo magistrado ao condenar um pequeno comércio (um açougue p. ex.) das pequenas cidades do interior no mesmo valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) certamente estará condenando o microempresário à bancarrota.

    Por esses motivos, na quantificação do Dano Moral, o magistrado deve estar atento ao seu caráter dúplice, punindo o ofensor para que ele se sinta desestimulado a não causar outras ofensas aos consumidores.

    Acreditamos que esses casos, ainda que forçosamente, são casos parecidos com as questões de ação de alimentos em que sempre existiu outro binômio: necessidade/possibilidade. Ou seja, o valor das pensões tem que ser equilibrado. Não adianta a pessoa querer um valor de pensão alto de um(a) alimentante que aufere parcos recursos mensais.

    Esse é justamente o caso dos pequenos estabelecimentos. Indenizações altas poderiam fazer o comércio até cerrar suas portas. Logicamente que eventuais reincidências deveriam ser punidas em valores mais altos, sob pena de se privilegiar o negligente comerciante.

    Acreditamos que esse é um raciocínio lógico e simples e que de maneira diversa deveria ser aplicado contra as grandes empresas, que dia a dia aumentam seus lucros à custa de consumidores lesados e com hipertensão de somente ouvir falar em Call Center.

    E é justamente no caso de grandes empresas que novamente a jurisprudência, pelo menos de nossa região, vem mudando seu entendimento em relação à quantificação dos danos morais.
Atualmente o valor das condenações está variando de R$ 500,00 (quinhentos reais) a R$ 3.000,00 (três mil reais).

    Importantíssimo consignar que essas grandes empresas, há pouquíssimo tempo, vinham para a audiência de conciliação com propostas que chegavam até a R$ 8.000,00 (oito mil reais), ou seja, mais que o dobro, quase o triplo do que vem sendo arbitrado hoje em alguns fóruns de nosso Estado.

    Francamente não sabemos o motivo desse arbitramento ínfimo por parte dos Magistrados. A quem tal posição interessa?

    Nos corredores dos fóruns já se fala que isso é uma orientação vinda das cortes superiores para que as pessoas fiquem desestimuladas a entrar com as ações indenizatórias.

    Com a primeira redução de valores, que foi feita de maneira até coerente pois tudo no direito tem que ser analisado, empurraram as ações para os Juizados Especiais. Agora querem mandar pra onde?
No site do Superior Tribunal de Justiça foi veiculada notícia de que uma condenação da empresa Amil foi majorada para R$ 8.000,00 (oito mil reais). A empresa foi condenada porque se “recusou a arcar com os gastos decorrentes de laparotomia de emergência”.

    Nas instâncias inferiores, foi condenada ao pagamento de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de indenização pelos danos morais sofridos decorrentes da negligência do Plano de Saúde.

    Francamente! O sujeito tem que ter a sua barriga aberta para exame, certamente deve estar passando por dores horríveis e o Plano de Saúde não autoriza a cirurgia.

    Depois de anos de abrasivo litígio vem a condenação: R$ 3.000,00 (três mil reais)! Uau! A justiça foi feita!

    Ocorre novamente uma inversão de valores em nosso Brasil.

    Em vez de punirmos quem reiteradamente vem persistindo em erros apenas por ganância, vamos desestimular os consumidores a buscar os tribunais (com t minúsculo de propósito!).

    Ouso ainda pensar que essas condenações também são voltadas a desestimular os próprios causídicos a trabalharem.

    Qual valor seria justo para um advogado receber depois de trabalhar por longos anos defendendo o direito de seu constituído e ao final sair com uma sentença de três mil reais?

    As sucumbências, no mais das vezes, são arbitradas em patamares de no máximo 15% das condenações.

    Neste viés a nossa justiça (minúscula de novo) desestimula agora os próprios advogados a não patrocinarem mais esse tipo de ação.

    Petição inicial, impugnação, duas (ou mais) audiências, agravos, recurso, julgamento do recurso, recurso para as instâncias superiores, ufa!

    Quanto pode valer este trabalho?

    No mais das vezes os advogados não vão ganhar mais que R$ 1.000,00 (um mil reais) em ações que podem durar mais de cinco, às vezes até oito, dez anos.

    De outro lado as empresas de Telefonia, os Bancos, os Planos de Saúde, as empresas de fornecimento de energia elétrica dão risada e zombam dos consumidores, ganhando mais e mais, e o pior: persistindo nas mesmas práticas ilegais e imorais. Não respeitam a lei e nem decisões porque sabem que no final a indenização vai ser baixa e as multas diárias serão revogadas, porque segundo a grande maioria dos julgadores isso configuraria enriquecimento ilícito.

    Decerto lícito, então, é o enriquecimento dessas empresas?

    O consumidor acuado acaba sendo desestimulado pelo poder que mais deveria protegê-lo: o Judiciário.

    Poder este que sempre foi a última trincheira dos consumidores lesados por inscrições e abalos de créditos ilegais, cobrança de juros em patamares astronômicos, por recusas infundadas de planos de saúde e outras tantas situações, percebem que nos dias de hoje essa trincheira já não lhes protege e, pelo que parece, até mudou de lado.

    Quem hoje nada de braçada são as grandes empresas que dia a dia saem em jornais como campeãs de reclamação, e agora protegidas por uma Justiça que de cega não tem nada, e a sua outrora temida espada já não aponta para onde deve ser realmente aplicada. Volta-se contra o lado mais fraco e, justamente por isso, o mais necessitado e menos entendido.

    Em anos de luta forense aprendi que, mais dia menos dia, quem aplica a Lei acaba ofendido por essas mesmas empresas e, depois disso, sentindo na pele o que todos os seus jurisdicionados já sentiam por anos, acaba enfim mudando o entendimento e punindo com mais rigor quem desde sempre vem zombando da Lei, dos Consumidores e principalmente da Justiça.

    É só aguardar.

*Gustavo Tostes Cardoso é advogado e conselheiro estadual suplente da OAB-MT

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