O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) poderá instaurar, de ofício ou a pedido das seccionais, processos ético-disciplinares contra profissionais que tenham cometido infrações que atentem contra a dignidade da advocacia. Pelo menos é o que prevê o projeto de lei apresentado pelo senador Álvaro Dias (PSDB-PR). A proposta modifica o artigo 70 do Estatuto da Advocacia e permite que o órgão maior da entidade intervenha em casos cuja repercussão negativa ocorra em âmbito nacional.
Pela legislação atual, as ações só podem ser movidas pelas seções instaladas na localidade onde a falta tenha acontecido. O Conselho Federal só se manifesta quando o advogado punido interpõe recurso. O projeto, no entanto, não retira a autoridade das seccionais para instaurar processos administrativos contra advogados infratores. De acordo com a proposição, porém, independentemente do órgão que venha a instalar o procedimento administrativo, o Conselho Federal poderá suspender o advogado até a conclusão da ação.
O presidente em exercício da OAB Nacional, Aristoteles Atheniense, explica que a proposição é de autoria da entidade. Ele afirmou que o texto foi aprovado pelo próprio Conselho Federal há dois meses, com o objetivo de aperfeiçoar os mecanismos hoje existentes para a punição do mal profissional. Segundo o artigo 70, o processo só pode ser instalado no local onde ocorreu a infração, independentemente da unidade onde o profissional estiver inscrito.
No entanto, estamos vivendo na época da globalização do crime organizado, e esse requisito precisou ser revisto, afirmou o advogado, acrescentando que esta necessidade foi sentida após a divulgação do caso envolvendo os advogados paulistas Maria Cristina Rachado e Sérgio Wesley, que compraram de um funcionário da Câmara dos Deputados depoimentos de delegados sobre a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), que foram cedidos a parlamentares durante sessão fechada da CPI do Tráfico de Armas.
Eles eram advogados em São Paulo, mas a violação ocorreu em Brasília. Com este episódio começou-se a discutir qual seccional seria competente para instaurar o processo ético-disciplinar, a paulista ou a do Distrito Federal. A seção paulista queria passar a bola para a seção de Brasília, que, por sua vez, queria fazer o mesmo. O Conselho Federal chegou, então, a conclusão de que deveria ser revisto o dispositivo que diz que a responsabilidade compete a seccional em cuja base territorial ocorre a falta, informou.
De acordo com Atheniense, a mudança, se aprovada, ajudará a desafogar os tribunais de ética das seccionais. A proposta se dá em face desse conflito de competência. Pelo projeto, o Conselho Federal, que até então apenas analisava recursos, poderá instaurar processo, julgar e suspender o advogado infrator. Acho que essa é uma boa solução. Além disso, vamos desafogar os conselhos estaduais, disse.
Na avaliação de Álvaro Dias, a proposta tem como objetivo evitar a contaminação da advocacia pela insegurança criada pelo crime organizado, que promove a percepção de que a guerra travada entre as instituições e a criminalidade tem reduzido o poder do Estado, uma vez que tem atingido a categoria dos advogados. Por essa razão, afirmou o senador, tendo em vista o bom nome da advocacia e o conceito da OAB, é conveniente outorgar à entidade, meios que efetivamente propiciem resposta aos anseios da coletividade.
Para o presidente da OAB do Rio de Janeiro e coordenador do Colégio de Presidente de Seccionais, Octavio Gomes, a proposta de permitir que o Conselho Federal da entidade intervenha em casos cuja repercussão negativa ocorra em âmbito nacional não fere a autonomia das seções. Segundo ele, os dirigentes das unidades estaduais estão de acordo com o projeto, já que este tem como objetivo tornar os mecanismos de punição da entidade mais transparentes.
Entendo que a mudança torna a OAB extremamente transparente. Mostra que a entidade é intransigente com as prerrogativas dos advogados e que não é corporativista. As demais seccionais concordam com esse projeto, afirmou o advogado.